Indústria brasileira de pneus amplia importações em 203,3% no 1º bimestre

Bridgestone, Continental, Goodyear, Michelin, Pirelli e Sumitomo importaram 175.561 unidades entre janeiro e fevereiro deste ano, contra 57.936 unidades no 1º bimestre do ano passado.

A indústria brasileira de pneus elevou as importações de pneus de carga – usados em caminhões no transporte de mercadorias e de ônibus para o transporte de passageiros  – em 203,03% no primeiro bimestre de 2014 comparativamente ao mesmo período do ano passado.

Na soma geral, Bridgestone, Continental, Goodyear, Michelin, Pirelli e Sumitomo importaram 175.561 unidades nos primeiros dois meses do ano. No mesmo período do ano passado haviam importado 57.936 unidades, uma diferença que reflete alta de 203,03% entre os períodos analisados.

Esses dados são diametralmente opostos ao comportamento das importações realizadas pelos chamados importadores independentes – um segmento que vem sofrendo ano a ano ações de defesa comercial empreendidas pela Associação Nacional da Indústria de Pneumáticos (ANIP), que considera a importação um dano à indústria nacional e mais que isso, prega que o segmento realiza suas operações com preços abaixo do convencional, nominado tecnicamente por dumping.

Enquanto a indústria importou 203,3% a mais no primeiro bimestre do ano, os importadores independentes assistiram a um recuo de 11,8% em suas importações de pneus de carga no mesmo período. Isso mesmo: a indústria que prega a defesa comercial contra o pneu importado realizou compras 203,3% maiores, enquanto os independentes reduziram suas compras no exterior em 11,8%. Foram 190.212 unidades importadas pelos independentes entre janeiro e fevereiro deste ano. No 1º bimestre do ano passado haviam sido importados 215.688 pneus.

Os dados acima fazem parte de balanço realizado pelo Departamento de Economia da Associação Brasileira dos Importadores e Distribuidores de Pneus (Abidip), e, na visão do diretor executivo da ABIDIP, Milton Favaro Júnior, eles mostram, senão uma situação paradoxal, ao menos um quadro em que só a indústria é que ganha.

“As indústrias produtoras de pneus nacionais importaram mais que o dobro de pneus de carga em comparação ao mesmo período de 2012 e o que surpreende é que uma das empresas integrantes da Anip, a Sumitomo Rubber, que atua no Brasil através das marcas Dunlop e Falken, apresenta números impressionantes de importação e a preços mais baixos do que qualquer importadora que opera no Brasil”, afirma Milton Favaro Junior.

Segundo o levantamento da ABIDIP, a Sumitomo Rubber/Dunlop respondeu por 46,97% de todas as importações de pneus de carga feitas pelos fabricantes de pneus nacionais no primeiro bimestre. “Só a Sumitomo/Dunlop trouxe 82.456 unidades no período, um número que representa aumento de 264,14% quando comparado ao mesmo período do ano passado”, diz o diretor executivo da ABIDIP.

Mas não foi a única: a Pirelli ampliou suas importações em 410,09% no mesmo período (trouxe 19.363 pneus de carga do exterior), a Goodyear aumentou suas importações em 275,66% (trouxe 33.340 unidades), a Michelin elevou as importações desse tipo de pneus em 75,18%, para 27.751 unidades, seguida pela Bridgestone que ampliou a importação em 36,97%, para 9.122 unidades. Percentualmente, a campeã das importações em 2014 foi a Continental: alta de 2.840,83%, para 3.529 pneus de carga oriundos do exterior. O mais engraçado aqui é que a Continental se instalou no Brasil para ser uma plataforma EXPORTADORA de pneus, mas está se transformando em plataforma IMPORTADORA de pneus.

“O que chama a atenção não é apenas o volume das importações feitas pela Sumitomo, que trouxe 82.456 pneus de carga do exterior, mas os preços que ela pratica para realizar a importação desses pneus e o valor de venda desses produtos no mercado interno. Quando a empresa não tinha fábrica no Brasil e operava a partir de importadores independentes, o preço de seus produtos era quase o dobro do valor que a empresa informa HOJE em seus registros de importação”, descreve Milton Favaro Junior.

Nos bastidores do mercado brasileiro de pneus 10 em 10 executivos do setor sabem que a Sumitomo Rubber é alvo de processo por dumping em pneus no Brasil, algo que valeu até um racha dentro da ANIP no ano passado, quando a entidade que defende a indústria elaborou um documento a ser analisado pela Câmara de Comércio Exterior (Camex) indicando a prática de dumping pela Sumitomo. Na época, executivos da Bridgestone se negaram a assinar ou a participar do pleito da ANIP porque eram contra a declaração por dumping contra pneus importados oriundos do Japão.

Segundo o diretor executivo da Abidip isso ocorre à total revelia do controle, gestão e fiscalização de órgãos do governo, como Receita Federal, Secretaria de Comércio Exterior (Secex), Câmara de Comércio Exterior (Camex), do Ministério da Indústria e Comércio Exterior (MDIC) e até mesmo da Associação Nacional da Indústria de Pneumáticos (Anip), a guardiã dos processos por antidumping contra importadores independentes de pneus – que aceitou a entrada da Sumitomo Rubber como associada à entidade.

A Sumitomo informa já ter aplicado R$ 750 milhões na construção de sua fábrica em Fazenda Rio Grande, no Paraná. A planta industrial começou a produzir pneus de passeio em outubro do ano passado, mas agora a empresa anuncia a intenção de investir R$ 1 bilhão para construir uma unidade apenas para a produção de pneus de carga, isso a partir de 2017, mas esse investimento só será concretizado se a ANIP, que está com processo antidumping contra pneus de carga oriundos do Japão não validá-lo junto ao governo.

“Ou seja, eles estão com preços de importação que identificam dumping, têm incentivos fiscais e tributários do Governo do Paraná, são associados da ANIP e dizem que só vão investir se o governo não aceitar o pedido por antidumping que a ANIP protocolou na Camex. Se isso se concretizar iremos entrar com pedido junto ao Ministério Público Federal para investigar este cenário. A Sumitomo despencou seus preços justamente após o último período investigado pelas autoridades brasileiras para aplicação do antidumping, o cenário é muito pior do que parece. Os preços deles são melhores e bem menores que os pneus importados da China e sem nenhuma medida protecionista”, diz Milton Favaro Junior.

Goodyear briga com a Sumitomo

A Sumitomo Rubber não é alvo de questionamentos apenas no Brasil, mas no exterior também. Em fevereiro deste ano, a Goodyear entrou com pedido formal para a dissolução da aliança estratégica firmada com a Sumitomo desde 1999. O processo rola junto à Câmara de Comércio Internacional e o motivo do pedido da Goodyear é bem claro. A Goodyear atesta que a Sumitomo Rubber está envolvida em conduta anticompetitiva e de violação às leis antitruste em seus mercados de atuação e deu prazo de três meses – contados a partir de 14 de fevereiro de 2014 – para que a Sumitomo assine um termo de saída da aliança estratégica.

Nessa aliança, a Goodyear detém 75% de participação na produção da Sumitomo e 25% dos ativos da Goodyear Dunlop Tires Europe B.V. (GDTE) e Goodyear Dunlop Tires North America Ltd. (GDTNA), o que lhe dá os direitos da marca nesses dois mercados. No Japão, a aliança garante 75% dos direitos de vendas das marcas Goodyear e Dunlop para a Sumitomo Rubber, além da exploração dos mercados de reposição, equipamentos originais e transferência de tecnologia.

De onde vêm os pneus?

Diferentemente do que a ANIP sempre diz, não é da China a maior procedência dos pneus de carga importados pela indústria brasileira de pneus, mas sim, do Japão. Só em janeiro e fevereiro deste ano 24,14% das compras externas de pneus para o segmento, equivalentes a 88.323 unidades, vieram do Japão.

Da China vieram 65.592 unidades, ou 19% do total, ante 40.756 unidades da Coreia do Sul (11,14%), sendo outros 23.854 unidades oriundas do México (6,5% de participação) e da Colômbia, com 10,605 unidades, equivalentes a uma participação de 2,9% do total.

“Outro fato que chama a atenção é que a indústria brasileira de pneus fechou 2013 com exportações de pneus em queda de 37,1% para os Estados Unidos”, diz Milton Favaro Junior. “Foi a maior queda entre os 10 maiores exportadores de pneus para aquele mercado em um ano em que as importações de pneus para os Estados Unidos foram recordes, segundo dados do Departamento de Comércio dos Estados Unidos”, diz ao apontar para a baixa competitividade dos pneus brasileiros em mercados maduros.

 “A percepção que temos é de que a ANIP e a indústria de pneus querem manter o mercado brasileiro cativo. Só elas podem produzir, comercializar, importar e vender pneus. O interessante é que ao competir com o pneu importado, alegando que é mais barato, ela corre atrás do governo para pedir antidumping. O detalhe interessante em tudo isso é que os preços dos pneus importados pelas multinacionais instaladas no Brasil são, muitas vezes, mais baratos que as marcas sul-coreanas que entram no país e, às vezes, até mais baratos que pneus chineses importados por empresas independentes, e este preço não é repassado ao consumidor, ao transportador. Pelo contrário, dados do Departamento de Estudos Econômicos e Custos Operacionais (Decope), da NTC&Logística, mostram que o pneu  de transporte na medida 275/80 22,5R subiu 12,7% no ano passado, ante aumento de 6,88% na medida 215/75 R17,5.  Um país em que 60% do transporte é feito por caminhões não pode se dar ao luxo de ter pneus caros ou de ficar preso a uma indústria que só quer fazer aquilo que ela quer, como é o caso da Sumitomo, que até chantagem faz contra o governo”, diz.

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